terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Masters of Horror: Sounds Like de Brad Anderson (2x04)

O DIA DOS PRODÍGIOS


Aos 37 anos, Brad Anderson realizou aquilo que me parece ser uma verdadeira obra-prima do cinema de terror. "Session 9" (2001), o filme em questão, passou despercebido nos grandes circuitos, pois tratava-se de um filme independente, um low-budget, e também um filme cuja génese estava anos-luz à frente das vulgaridades que recentemente mais se vêem no cinema de terror e que são bem aceites. Precisamente por se manter fora de todas as convenções, e estar mais preocupado em denotar uma identidade, e uma tão forte, "Session 9" era um filme absolutamente prodigioso.
Aquando da sua participação em "Masters of Horror", Brad Anderson contava apenas com cinco filmes -entre os quais uma curta-metragem- e, desses cinco, apenas dois eram de terror, "Session 9" e "The Machinist" (2004). No entanto, penso que "Session 9" justificaria perfeitamente a inclusão de Anderson nesta série.


E, agora de a década terminou, posso dizer com segurança que "Session 9" me parece verdadeiramente o melhor filme de terror entre 2000 e 2010, havendo apenas um capaz de quase ombrear com ele, "Jeepers Creepers" (2002) de Victor Salva.
Interessa muito falar de "Session 9" a propósito deste "Sounds Like", pois nalguns pontos os dois filmes se aproximam.
Tal como em "Session 9", neste filme encontramos um protagonista afogado numa vida familiar difícil, e, tal como em"Session 9", comportamentos ligados às doenças mentais como psicoses ou esquizofrenias são utilizados.
"Sounds Like" conta-nos a história de Larry Pearce (Chris Bauer), um telefonista, que sofre de uma complicada doença- ouve tudo, tudo, tudo, desde os mais pequenos movimentos do corpo, como piscar de olhos. O resultado é que o seu dia-a-dia é uma infeliz cacofonia, não conseguindo nunca descansar nem isolar-se completamente. Paralelamente, a sua relação com a mulher tornara-se difícil, pois, além do desagrado de Larry por ouvir tudo o que ela fazia, o filho que tinham havia morrido, e presentemente encontram-se em desacordo sobre se devem ou não ter outro.
Larry é, desde logo, uma personagem incomunicável. O excesso de audição faz com que frequentemente ele seja incapaz de distinguir, do que ouve, o importante do insignificante. O seu cansaço, acrescido do stress pós-traumático da perda da filha, fazem dele também um indivíduo estranho, com alguns comportamentos não distantes da catatonia.
Não se pode dizer que "Sounds Like" seja propriamente um filme de terror. Mas a tensão que nele sentimos, a angústia que resulta de também nós ouvirmos a cacofonia constante que Larry atravessa, cria em nós tamanho desconforto, que, de repente, este filme assusta-nos.
À medida que a tensão cresce, prevemos que Larry cai cada vez mais numa loucura desesperada, que poderá ou não ser uma espécie de surto psicótico. É decisivo se conhecemos ou não a natureza de algumas doenças mentais para entender "Sounds Like", pois aí mesmo se traça a divisória entre o acto de desespero resultante de um colapso e a pura maldade. Tal acontecia também com "Session 9", daí que eu diga que é importante tê-lo como contraponto para falar desta média.


A sequência final é mais uma prova da mestria de Brad Anderson, pois em nenhum outro filme senão o próprio "Session 9" vimos uma cena tão comovente, tão capaz de fundir perfeitamente beleza, paz e medo.
Sendo um dos realizadores mais jovens e mais inexperientes em "Masters of Horror", Brad Anderson não deixa de nos surpreender pela sua inteligência e sensibilidade e pela estranheza absoluta do seu mundo, da sua identidade. Lembro-me de um aforismo muito interessante de Agustina Bessa-Luís, que abre o seu romance "A Jóia de Família": "Não se escreve melhor porque se escreveu muito." Brad Anderson, em "Sounds Like", vem mais uma vez provar-nos que, no que toca à arte, algumas pessoas, independentemente da experiência que têm, são naturalmente capazes de criar coisas impressionantes.
Faz todo o sentido ver com muita atenção o cinema de Brad Anderson, mais ainda agora que nos chega "Vanishing on 7th Street" (2010); e dar particular ênfase a filmes como "Session 9" ou "Sounds Like", que, por ser uma média e um episódio de uma série de televisão, não é menos importante.

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