domingo, 26 de agosto de 2007

Cecilia Bartoli: Opera Proibita

TRÊS HOMENS E UMA MULHER






O que percebo eu de ópera? Sinceramente, não percebo nada. Mas sinto-me obrigado por mim mesmo a falar do mais recente álbum de Cecília Bartoli, "Opera Proibita", uma vez que é um dos álbuns que mais me tocou, de sempre. Canta composições de George Frideric Handel (1685- 1759) enquanto jovem, António Caldara (1670-1736) e Alessandro Scarlatti (1660-1725), todos eles compositores Barrocos italianos.
Esta época particular, o Barroco é, como se sabe, uma época de dualidades. No século XVII, após a "crise das consciências"do Renascimento, em que, em vez de Deus, era o Homem o centro do universo, a Igreja decide contra-atacar, também para se defender do Protestantismo. Assim nasce a génese do Barroco, a estética do exagero, com o intuito de seduzir quem vê, de atraír e sensibilizar as pessoas sobre Deus. Com base nesta manipulação se construíram algumas das mais belas igrejas de sempre, e se produziram as mais prodigiosas peças de arte. Bernini, Caravaggio, Georges de la Tour, Maderno, Borromini ou Nicolas Nasoni são alguns dos artistas que mais se destacam nesta época. No campo da música, no entanto, as coisas eram diferentes. A igreja decide proibir a ópera, dizendo que agora é tempo de rezar e não de nos divertirmos, e proíbe as mulheres de interpretar música, o que acaba por originar a existência dos castrati, homens com vozes efiminadas que interpretavam mulheres. Mas os compositores da época não desistem de compor ópera, e fazem-no, mas garantem que o que compõem é música religiosa. Destacam-se nomes como Antonio Vivaldi, Bach ou o português Carlos Seixas.
É este tipo de árias que Cecilia Bartoli interpreta aqui, e é a sua carga histórica que dá título ao álbum, gravado com a orquestra dos Musiciens du Louvre, sob a direcção de Mark Mikowski.
Abre com "All´Arme Si Accesi Guerrieri" de Scarlatti, uma ária alegre e glamorosa, ideal para a abertura do álbum. Roma cabe lá dentro, sem dúvida. A voz de Cecília é bonita (Ela também.), digo eu que será potente, parece bastante á-vontade com a ginástica vocal que faz, ou seja, uma boa intérprete.
De todas as árias que interpreta, as que mais me tocaram foram "Notte Funesta... Ferma L´Ali" de Handel, "Caldo Sangue" de Scarlatti e, principalmente "Si Piangete Pupille Dolente" de Antonio Caldara. Uma das mais belas coisas que já ouvi na vida.
Não posso dizer muito mais, porque corro o risco de dizer disparates, isto se já não o fiz. O que eu queria mesmo dizer é que gostei muito deste álbum, independentemente do que disserem os especialistas na área.




Veredicto Final (E De Um Ponto de Vista Puramente Pessoal)_ 19/20

Alergias Legítimas

A Rolling Stone levou a cabo uma sondagem em que o resultado seria uma lista das dez canções mais irritantes de sempre. Um comentário pessoal para cada um, uma vez que adorei a lista:
1. "My Humps" BLACK EYED PEAS: Um primeiro lugar muito justo, sim. De facto, Fergie e os seus comparsas poderiam fazer tantas coisas, porquê música? Não é justo que tanta gente ande a cantar em bares na noite da guitarra e que os Black Eyed Peas que não estão a fazer nada andem a gravar álbuns. Essa senhora, ainda por cima tem o descaramento de nos dizer que gravou um álbum a solo, quando a verdade é que o que muda é o nome que aparece na capa. Will.I.Am e o resto desses atrasados mentais está por lá, e nos videoclips também. "My Humps" é uma canção irritante, mas não mais que outras como "Shut Up", "Where Is The Love" ou "Don´t Phunk With My Heart". Uma tristeza.
2. "Macarena" LOS DEL RIO: Eu já nem me lembrava que esta música existia. Do pior. A música latina sempre nos mostrou que por vezes não gosta de legitimar Glória Estefan, e é uma pena, porque isso dá origem a coisas como esta. Coisas como estas nem merecem que se lhes chame música. Sem comentários.
3. "Who Let The Dogs Out" BAHA MEN: Esta música só tinha piada quando passava no genérico de "100 Deeds For Eddie". Fora daí, deviam proíbi-la. Umas vozes que fazem lembrar um personagem dos Batanetes sobre umas percussões de quinta categoria e resultado: nunca soubémos quem deixou os cães saír.
4. "My Heart Will Go On" CELINE DION: Bom exemplo de uma música arruínada pelo abuso. Tudo bem, foi muito gira no Titanic, aparte de ser uma sentimental do pior, Celine merece crédito pela voz potente, mas toda a gente abusou de My Heart Will Go On. Resumo da ópera: já ninguém suporta ouvir esta canção que há não tão poucos anos atrás venceu o óscar de Melhor Canção.
5. "Photograph" NICKELBACK: Todos sabemos que a banda de Chad Kroeger teve momentos mais felizes que este. "Photograph" é de facto álgo de irritante, uma mistura de letra do Bazar Oriental com uma melodia composta sobre os joelhos a meias com uma guitarra. O produto final é para esquecer. Lembremo-nos de "How You Remind Me".
6. "Mambo nº5" LOU BEGA: Esta não conheço. Acho eu.
7. "You´re Beautiful" JAMES BLUNT: Dêem-lhe um tiro! Por favor. A voz é irritante ao fim de escassos segundos, a música é exasperante, as guitarras hispânicas já estão mais usadas que as Vans nestes dias, e ainda falta falar da letra. Diz-nos este génio: "Eu vi um anjo disso estou certo, ela sorriu para mim no metro, estava com outro homem, mas não vou perder o sono por causa disso porque tenho um plano: tu és linda, é verdade." Belo plano. Não admira que no fim ele diga que nunca vai estar com ela.
8. "Wannabe" SPICE GIRLS: Como devem achar que ainda não nos torturaram o suficiente com coisas como esta, parece que estas meninas ainda se vão juntar de novo, devido á falta de algo para fazer de Victoria Beckham. "Wannabe", o cúmulo do previsível. Ficará na história, decerto, como uma das piores músicas de sempre. Alguém tem de ficar.
9. "The Thong Song" SISQO: Também não me parece que conheça.
10. "Believe" CHER: Realmente, já não há paciência para ouvir este hino de libertação feminina fora de tempo. E também não há paciência para aquelas piruetas que ela faz para escamotear a falta de boa voz. Podia sempre voltar ao cinema, mas pronto, ela prefere fingir que acredita que nos acreditamos que ela sabe cantar. Ou preferia, uma vez que já fez a sua "Farewell Tour". Boa ideia.
QUEM EU ACHO QUE FALTA:
"Umbrella" RHIANNA: se traduzirmos, dá para perceber que ela diz "fica debaixo do meu guarda-chuva, uva, uva, uva, yeah, yeah, yeah." Muito giro.
"Sexyback" JUSTIN TIMBERLAKE: Shoot him!
"Candyshop" 50 CENT: Torture him!
Peace guys!

quinta-feira, 23 de agosto de 2007

Zero7: The Garden

O JARDIM E O QUINTAL


"Simple Things", o primeiro álbum dos Zero7 é um álbum digno de ficar na memória de todos nós. Electronica bem-construída, e discreta, canções compostas com mestria, e as vozes de Sia Furler, Sophie Barker e Mozez, era,m razões inequívocas que faziam da banda de Henry Binns e Sean Hardaker uma promessa. O que em tal peça era original, interessante e bom, no entanto, perdeu muita originalidade em "When It Falls", onde se juntava a voz de Tina Dico, e onde se jutava também um aumento de predictabilidade. As canções eram ainda boas, e ainda eram interessantes. O problema de "When It Falls" era soar a uma versão melhorada de "Simple Things". Mas acabava por não ser um tiro falhado, devido ao brilhantismo de canções como "Somersault", entregue a Sia, ou "Warm Sound", com Mozez, "Passing By" com Sophie Barker, ou "The Space Between" com Tina.
Em "The Garden", é impossível evitar o sentimento de confusão: as canções continuam a não ser originais, mas agora, algumas tornaram-se também desinteressantes. São boas composições, complementadas com boas letras e boas vozes, a electrónica tão bem construída como sempre, mas as canções, por vários motivos, não despertam interesse, porque se simplificaram no sentido da pop.
"Futures" e "Throw It All Away" fazem bom começo, envolvente, o problema é que que o que se segue contém raríssimos momentos que consigam, pelo menos, igualar estes dois. O primeiro tem a voz de José Gonzales, e essa voz tem um timbre suave, adapta-se bem, mas não é brilhante. No entanto, a instrumentação, principalmente no final, faz da canção consistente. "Throw It All Away" tem Sia na voz, e é uma boa música alicerçada pela fusão surpeendente do lado acústico com o electrónico, rematada por uma bateria acelerada.
E é precisamente Sia quem engrandece uma boa parte das canções, com a sua excelente performance (Que, de resto, não é surpresa alguma.) sensual e suave, além de grande perfeccionismo. "You´re My Flame" é um exemplo. O instrumental é seguro, mas tem uma beat parecida com alguma que já ouvimos até aqui, e isso torna-se preocupante quando esta é só a quinta faixa. A letra é excelente, ainda que nos relembre demasiado "Somersault".
Ainda sobre Sia, enquanto que "This Pageant Of Bizarre" e "If I Can´t Have You" não são particularmente interessantes, "This Fine Social Scene" acaba por pontuar tanto como "Throw It All Away" (É o tal momento raríssimo que iguala os primeiros.) e "Waiting To Die" vai ganhando consistência quanto mais se ouve, e revela-se uma boa música, interessante no contraste criado pela tonalidade muito alegre com que Sia canta "La, la, la, la, la, we´re waiting to die."
Gonzalez não deixa de despertar interesse por ser uma novidade, mas acaba por não ser uma mais-valia para a dupla ("Futures" só se torna brilhante pelos instrumentos.), e não deixa de parecer um pouco deslocado daqui, por ter uma performance bastante "aluada", e, consequentemente, distante da personalidade musical dos Zero7, e das performances de Sia, Barker, Mozez ou Dico, que se apropriavam mais.
Outro foco de atenção em "The Garden" é este: não só se deixa Tina Dico, como também se deixam colaborações de há muito, Sophie Barker (O seu timbre não era assim tão diferente do de Sia, mas tinham posturas completamente diferentes.) e Mozez (Uma postura oscilante, mas mais rica em emoção do que a voz masculina de agora.), o que faz com que este álbum se apoie imenso em Sia: primeiro porque as músicas de Gonzalez não se destacam assim tanto, como já se disse, e segundo porque as de Sia sim.
Em relação aos temas instrumentais, eles não diferem particularmente do que já se fez nessa área. São boas composições, mas que acrescentam menos do que seria desejável.
Longe de estarem no pico da criatividade e da qualidade, os Zero7 não fizeram um álbum mau, apenas um tanto desinteressante, e caminhando no pouco seguro caminho da pop. Sia ajuda a salvar o trabalho, mas esperemos que no próximo não seja preciso a loirinha estar a salvar os dois senhores...

Veredicto Final: 15/20

segunda-feira, 20 de agosto de 2007

Matthew Dear: Asa Breed

ALTOS VOOS






Afastado dos escaparates desde "Backstroke", em 2004, Matthew Dear regressa com "Asa Breed", finalmente. Classificado com indecisão como música electrónica, house minimalista, downtempo, etc, etc, etc (A história do costume.), Matthew consegue, agora, o seu melhor álbum, qualquer que seja o ponto de vista de que olhamos o seu trabalho, no conjunto.
"Asa Breed" começa com "Fleece On Brain", a um ritmo viciante, adornado com os barroquismos habituais em Dear, a repetição, a polifonia, e um certo ambiente caótico, tudo existindo á volta da sua voz, gutural e cavernosa. E é nestes conceitos que este trabalho se movimenta, mas sem que cada faixa se torne simplesmente mais do mesmo.









Em relação á estética da repetição quase psicadélica das notas, ela resulta bem, porque, sem dúvida, envolve-nos na canção, e leva-nos a conhecê-la rapidamente, e, logo, a aderir a ela. Acontece, por exemplo em "Shy" onde a construção, perfeita, cresce á volta da repetição não só de determinadas notas como dos sons electrónicos que as produzem, e também na letra. A questão das letras aqui também deve ser referida, porque, em comparação a "Leave Luck To Heaven" e a "Backstroke", "Asa Breed" apresenta as letras mais cuidadas, e, consequentemente, mais bem escritas, até porque, de qualquer forma, se adptam perfeitamente aos conceitos musicais do álbum.
A ultilização que Matthew faz dos diferentes samplers neste álbum pode, por vzes, deitar por terra as opiniões que lhe atribuem a house minimalista. Não é que seja tão maximalista como Bjork, mas certamente utiliza mais sons do que habitualmente, o que, por sinal, foi uma boa opção, uma vez que ajuda a diversificar a sonoridade, no total, e também individualiza um pouco o álbum, em relação aos anteriores.
Tudo isto resulta, realmente, numa sonoridade mais temperametal, que prima por saír dos canones da música house como ela é feita normalmente. Aproxima-se, por vezes, mais da electropop do que daquilo que tinha feito até agora. Em certas canções, o ritmo á maioritariamente dançável ("Neighbourhoods" ou o primeiro single "Deserter".), noutros, é principalmente um agradável caos, ou uma deliciosa psicose ("Elementary Lover", "Will Gravity Win Tonight".).
A voz, por fim, é também abordada como uma voz que realmente canta, no sentido literal da palavra, muitas vezes, afastando-se ligeiramente do hábito de Matthew de, principalmente arrastar e sussurrar.
Um álbum digno de ouvir, pois claro, por mais que não seja, para celebrar o Verão e as noites típicas... não que uma coisa implique a outra, claro.



Veredicto: 17/20

Matthew Dear @ Field Day - Neighbourhoods

Neighbourhoods, uma das faixas de "Asa Breed".

sexta-feira, 17 de agosto de 2007

Sia - Breathe Me (live)

"Breathe Me", captado por um retardado mental que se esqueceu de gravar o arranjo de cordas do final. Mas uma boa canção, ainda assim.

quinta-feira, 16 de agosto de 2007

Sia: Lady Croissant

CROISSANT MISTO








O terceiro registo a solo de Sia Furler, aka Sia, é um álbum ao vivo. Após colaborações nos três álbuns dos Zero7 (Para o bem e para o mal.), após o despercebido "Healing Is Difficult", após a descoberta de "Breathe Me" no final de "Sete Palmos de Terra", que acabou por dar uma injecção de popularidade ao álbum "Colour The Small One", Sia decide mostrar-nos o que faz ao vivo. Numa lista muito curta, devo dizer. "Lady Croissant" é constituido por oito faixas ao vivo, e uma faixa bónus de estúdio.
Numa coisa é indiferente se os álbuns de Sia são em palco ou em estúdio: são sempre mistos de coisas muito boas e coisas muito más. Sia Furler não é daquelas artistas que subindo ao palco nos faz esquecer os defeitos de estúdio.
O alinhamento começa com "Don´t Bring Me Down", de "Colour The Small One" (Também da BSO de "Sete Palmos de Terra".), uma das suas canções mais melancólicas e bem construídas. A coisa não corre mal, a única coisa que aqui não vem mesmo nada a calhar é a pronúncia arrastada de que Sia abusa por vezes, deixando-nos indecisos em relação ás palavras que está a dizer. Segue-se a primeira bomba dos Zero7, "Destiny", aqui sem Sophie Barker. Um momento interessante, instrumentalmente diminuído, como era de esperar, mas nada mau. "Blow It All Away", a única testemunha neste álbum de que "Healing Is Difficult", o primeiro, existiu, é um momento quase irrepreensível, por ser um dos poucos que ultrapassa mesmo a versão de estúdio.
"Lentil" é um original daqui, e uma boa canção, em que a voz aparece particularmente bem colocada. Sem nenhum defeito em especial, é um dos melhores momentos.



"Numb" é que já não corre tão bem. Sia deixa-se arrastar para vocalizações mais arrastadas e sentimentais, e em "I Go To Sleep", uma cover dos The Pretenders, cai no mesmo erro.
Em "Breathe Me", peca por querer saír demasiado da versão de estúdio. Ainda que ao longo da canção não se vá saíndo mal, acaba por, em certas partes, soar demasiado fria ou inexpressiva. Os ad libs que acrescenta no final são bons, contrpõe esta frieza. É uma pena que não se possa dizer que este é o melhor momento do álbum, porque é, certamente, a melhor canção que Sia já fez.
Em "Distractions", faz uma boa reconstituição, soando por vezes a uma espécie de smooth-jazz, só estraga tudo em, arrastar por vezes mais do que nunca a pronúncia, tornando algumas palavras literlamente incompreensíveis. Ainda assim, não deixa de ser um bom final.
A canção de estúdio chama-se "Pictures", e é inevitavelmente um momento a referir no álbum. Uma boa canção, a fazer esquecer a boa da Sia das baladas tristes, apresentando-nos uma melodia mais alegre, e uma letra bastante razoável.
Enfim, um álbum de Sia, para o bem para o mal, com o bem e o mal. Uma referência para o título, muito engraçado.
Veredicto: 16/20


quarta-feira, 15 de agosto de 2007

Maria de Medeiros em Viana do Castelo

Foi com a plateia lotadíssima que Maria de Medeiros se deparou quando, Terça-Feira, subiu ao palco do Teatro Municipal Sá de Miranda, em Viana do Castelo. Em apresentação estava o álbum "A Little More Blue", em que a cantora/actriz desenha jazz em cima de clássicos brasileiros saídos de referências como Caetano Veloso, Chico Buarque, Dolores Duncan e Ivan de Lins.
Tímida dentro do seu vestido azul, Maria começa com "Joana Francesa" que, tal como no álbum, surge ligada com "Acorda Amor", ambas de Chico Buarque. É precisamente em "Joana Francesa" que tem a pior interpretação da noite: não por ter cantado mal, mas por, talvez devido á timidez, se ter colado demasiado á versão de estúdio. Mas em "Acorda Amor" já são imperceptiveis os rastos de timidez, e consegue, por contraste, um dos melhores momentos da noite.
Após algumas palavras em que reafirma e reforça a carga política das canções, entra a matar por "A Little More Blue" de Caetano. A partir daí, tanto desfila com as canções que compõe o seu álbum de estreia, como apresenta outras, principalmente do reportório que Chico e Caetano escreveram no exílio, em Roma e Londres, respectivamente.
Aqui, quase disfarçadamente, Maria retira alguma consistência ao álbum: é óptimo que interprete canções exteriores a ele, especialmente quando o faz com tanto brilhantismo como em "Adolescente Sentimental", mas se, para isso, abandona temas que fazem parte do álbum, como "O Quereres", já não é tão bom.
Áparte disto, nada a dizer. Maria canta bem, muito bem, soube conduzir os músicos, o alinhamento estava bem feito, pensado para realçar não só a pessoalidade de Maria de Medeiros, como também as qualidades da sua voz.
Brilhou em "Samba de Orly", na dupla interpretação de "Tanto Mar", do qual fez questão de realçar a história, e ainda lhe acrecentou uma porção de "Grândola Vila Morena" de José Afonso, que não deixa de surpreender.
"A Noite de Meu Amor" assenta como uma luva tanto á voz como á postura de Maria, assim como "Começar de Novo" de Ivan de Lins parece reforçar um certo ar revolucionário que a filha do maestro Vitorino d´Almeida por vezes assume, consciente ou inconscientemente.
No meio de algo tão bonito, só tive pena que o público, na sua maioria, fosse pouco participativo, uma vez que me parece que algo tão bom merecia um pouco mais de reacção. Enfim.
Veredicto: 19/20

quinta-feira, 9 de agosto de 2007

Caroline Lufkin - Drove Me To The Wall

Ao vivo no KLPAC, Caroline interpreta "Drove Me To The Wall", certamente uma das melhores canções de "Murmurs".

Caroline: Murmurs

INOCÊNCIA TARDIA

Quando a voz de Caroline Lufkin se ouve pela primeira vez, em “Bycicle”, nota-se que há qualquer coisa nela. Não só na voz, como na música, e até na própria letra, em que, puerilmente, Caroline diz “I don´t remeber your face, but I remember your bycicle”. O que se segue não foge em nada a estas primeiras ideias. De facto, a génese do álbum “Murmurs”, o primeiro LP desta japonesa radicada nos USA, fica bastante explicada nos primeiros quase quatro minutos, a primeira faixa.



Mais a fundo: Caroline não fez nada completamente bem, mas também não fez nada completamente mau. No seu primeiro álbum tem boas canções, e tem outras menos boas. Cai, por vezes, no entanto, no erro de lhes dar um toque demasiado inocente, que acaba por parecer forçado. Essa inocência tem o seu interesse, e acaba por ser uma forma de individualizar Caroline, mas, há muito que se sabe, o que é demais é erro, e ela por vezes exagera. Exagera principalmente em “Where´s My Love”, precisamente o single que lançou um ano antes de “Murmurs”. Tudo em “Where´s My Love” é abusivamente infantil, como se Caroline andasse a saltar entre flores muito maiores do que ela, e a deitar-lhes pozinhos mágicos… Nisto tudo, o que temos? Só a pior canção do álbum. Aparte destas, nenhuma exagera tanto que se torne um abuso. Ou seja, a interpretação de Caroline é consideravelmente positiva, não deixando de dar, ainda assim, alguns passos em falso.
A nível instrumental, “Murmurs” é um exercício excelente da fusão do electrónico com o acústico, sem deixar de ser, alguma vez, minimalista. Veja-se “Everylittlething”, onde a beat salta sobre os cristalinos sons do fender rhodes. E esta composição instrumental acaba, muitas vezes, por amparar Caroline quando ela cai nos tais excessos. “Everylittlething” é, mais uma vez, um bom exemplo.
A melhor canção, não obstante, parece-me ser “Drove Me To The Wall”, onde a electrónica faz a história, não sem uma trama de arranjos que acabam por resultar numa canção acolhedora e esteticamente muito bem conseguida.
As comparações com Bjork, perdoem-me, são ridículas. A voz de Caroline não soa a mais nenhuma, ainda que por vezes lembre uma espécie de Joanna Newsom menos agressiva. A nível instrumental, é mais normal inseri-la entre os Zero7 e os Telepopmusik.
No resultado, Caroline promete-nos vir a ser irrepreensível, o que, por enquanto, não é, mas a construção instrumental e os arranjos (Da autoria da própria Caroline Lufkin.) são, certamente, de aplaudir. Uma vez que perca os excessos de inocência e os substitua por alguma garra, que é o que aqui falta, Caroline estará perfeita. Venha ela.

Veredicto Final_ 15/20

Maria João: João

CANTO DOS DEUSES



Muito se tem falado dos álbuns de Maria João, Maria de Medeiros, Teresa Salgueiro e JP Simões, por terem em comum uma coisa: serem álbuns de portugueses a cantar canções brasileiras. Sobre isso, já disse o que tinha a dizer quando comentei “A Little More Blue” de Maria de Medeiros.
Mas, sobre “João”, o álbum de Maria João, tenho outras coisas a dizer. Para começar, há que realçar uma coisa, que a própria Maria João já realçou: muito antes de estar na moda ser-se português e cantar com sotaque do Brasil, já ela o fazia. Exemplos recentes são as excelentes versões de “Undercovers”, a par com Mário Laginha, de “O Quereres” de Caetano Veloso, “Esse Seu Olhar” de António Carlos Jobim, “Marco Marciano” de Lenine, ou do tema folclórico “Cantiga (Caico)”. Isto para ir só ao mais recente. Ou seja, em Maria João, a escolha de cantar músicas brasileiras soa a algo muito coerente, e não inesperado, como acontece com Maria de Medeiros e Teresa Salgueiro.
De todos esses álbuns, “João” é, provavelmente, o melhor.
Maria João faz, como sempre fez, a opção de cantar as coisas como lhe soam melhor. Assim sendo, muitas vezes nem chega a usar o sotaque brasileiro, usando outros, ou usando mesmo a pronúncia portuguesa de Portugal. Isso é bom. Assume as canções como se as tivesse feito, com total liberdade de interpretação, e evita colar-se aos originais. Ao mesmo tempo, também se mantém na linha que a caracteriza ao longo dos dezassete álbuns anteriores.
A nível dos instrumentos, e dos arranjos (De Miguel Ferreira, dos Blind Zero e dos Clã.), escolhe também caminhos menos óbvios. Evita (E esse é um caminho que também Maria de Medeiros escolheu, mas de uma forma mais direccionada.) assim a pretensão de criar uma sonoridade “abrasileirada”, limitando-se a colocar aquilo que lhe parece, e á equipa da produção, o mais adequado.
Escolheu, também, um reportório diversificado, e, ao contrário de Maria e de Teresa, que se ficaram pelos veteranos, Maria João escolhe também autores mais recentes, interpretando Chico Buarque, António Carlos Jobim, Marcelo Camelo, Ary Barroso, Caetano Veloso, Edu Lobo, Marisa Monte, Geraldo Pereira, Vinicuis de Moraes e Zequinha de Abreu. Oferece-nos, então, estas interpretações, com toda a expressividade a que nos habituou, e com uma autenticidade omnipresente, criando, assim, performances únicas.
Temas de destque, “Retrato a Preto e Branco” de António Carlos Jobim, abre o álbum, e muito bem. Uma canção promissora, que contém já alguns dos traços genéricos daquilo que será o restante. “Choro Bandido” de Cida Moreira é outro, “A Outra” de Marcelo Camelo, que é o single de avanço, é, certamente, uma das interpretações mais valiosas do álbum, com arranjos de harpa simplesmente deliciosos, “Partido Alto” de Caetano Veloso, merece também referência.
Enfim, aparte de todas essas teorias da música brasileira em Portugal, “João” é, sem dúvida, um dos discos do ano, ou não fosse ele o decimo sétimo de uma cantora que, por dezassete vezes, já mostrou que é única.

Veredicto Final: 19/20

Maria João - A Outra

Video de apresentação do álbum, "A Outra" dos Los Hermanos, escrita por Marcelo Camelo

quarta-feira, 8 de agosto de 2007

Tracey Thorn: Out Of The Woods

O QUARTO DESARRUMADO





Seis anos depois do último álbum dos Everything But The Girl, treze anos depois de dar voz a "Protection" e "Better Things" dos Massive Attack, e vinte e cinco anos depois do seu primeiro álbum a solo, Tracey Thorn lança, de repente, "Out Of The Woods". O seu primeiro álbum a solo, que muita gente desconhece, foi lançado em 1982, com o nome de "A Distant Shore". Sendo uma espécie de solo, em que a voz de Thorn fazia suaves duetos com a guitarra acústica, quem o conhece, e agora ouve "Out Of The Woods", pode reparar logo numa coisa: este álbum tem um som muito mais 80´s do que "A Distant Shore". O facto do debut ser a tal gravação voz/guitarra e de "Out Of The Woods" ser mais diversificado, pode contribuir, mas a verdade é que estas compoisções nos transportam com mais rapidez para os anos oitenta. Nada contra. Nada contra, porque, na verdade, este segundo álbum da vocalista dos Everything But The Girl é bastante bom. A tal diversidade nos instrumentos ajuda a criar uma sonoridade que, no resultado, é mais intimista. As canções parecem fechar quem ouve num pequeno quarto, um quarto desarrumado, com muita coisa escondida no meio da desarrumação, tal como nos mostra a capa. Os arranjos são calculados ao milímetro, com pequenos pormenores que, sinceramente, não seriam de esperar em Tracey Thorn. Acontece, por exemplo, em "Easy", e ainda bem. Ora, "Easy" é, precisamente, uma das melhores canções do álbum, criada no ponto rebuçado entre os ritmos dançáveis de "It´s All True" ou "Get Around To It" e os sons mais melodiosos de "Here It Comes Again" ou no excelentíssimo "A-Z". Logo depois, esses sons inesperados surgem-nos de novo em "Falling Off a Log", outra das melhores canções do álbum, certamente, produzida também na linha do ponto rebuçado da anterior.
No meio dessa decisão de enveredar pelos eighties, Tracey só falha por questões de alinhamento, uma vez que as baladas, ao surgirem no meio de canções mais dançáveis, parecem ser rapidamente apagadas.
As letras vagueiam entre narrativas pessoais e mensages, como a "palavra de esperança" que deita aos adolescentes gays em "A-Z".
Alegou que este álbum é exactamente isso, este álbum, e que não terá promoção ao vivo. Thorn decidiu escolher a vida familiar á vida dos palcos, e quem somos nós para a julgar? Mas é pena, porque algumas canções mereciam mesmos ser colocadas ao vivo.
Sem um disco perfeito, ainda assim, Tracey Thorn fez um disco muito bom, e isso é, claro, muito bom. Vinte e cinco anos fazem a sua diferença, ainda que aqui pareça ao contrário.




Veredicto Final_ 17/20

Tracey Thorn

Video de avanço de "Out Of The Woods" para o single "It´s All True".

terça-feira, 7 de agosto de 2007

Kate Walsh: Clocktower Park

ROÇAR O CÉU

Apesar de saber como "Clocktower Park", o álbum de estreia de Kate Walsh, é bom, só agora me apeteceu comentá-lo. Em poucas palavras´, porque já me habituei a ele, é como se o conhecesse desde sempre, e torna-se cada vez mais difícil encontrar nele defeitos, uma vez que me afeiçoei a ele e aos sentimentos que consigo carrega. Mas digamos que "Clocktower Park" só peca por arriscar muito pouco. Só é mau na medida em que não foge daquilo que se espera de uma menina de 21 anos, com uma boa voz e que sabe tocar guitarra. Não é o som solista da Jewel de "Pieces Of You", mas não é a surpresa de um começo como o de Fiona Apple em "Tidal". Em tudo o resto, este é um excelente álbum. Pouco insistente, muito preciso: em dez faixas, diz-nos tudo. Passamos pela melancolia em todas elas, mas umas vezes num sentindo mais introspectivo, como acontece em "It´s Never Over" ou "Impressionable", outras vezes caminhando para um storytelling que, ainda assim, não abandona a primeira pessoa, o que acontece em "Animals On Fire" ou "Quicksand". Sem nunca resvalar para os dúbios trilhos da pop, Walsh remete-se ao seu rock, num som acústico e sóbrio, que vai desde o sussurrante em "June Bug", por exemplo, a um neo-barroco em "Sullen" ou a um som mais brilhante, como em "Holes In My Jacket". Desconhecida como qualquer bom músico em início de carreira, Kate Wlash escreveu, afinal, um álbum como poucos: falei em Jewel e em Fiona Apple, e ainda bem, porque Kate recusa dois erros que estas assumiram: não quis expor demasiado a voz como fez Jewel em 94, nem quis revelar demasiado a sua intimidade como fez Fiona em 95. A ver, fica o vídeo de "It´s Never Over", o lonínquo single de avanço, que, diga.se de passagem, foi muito bem escolhido. Obrigatório.

Veredicto Final_ 19/20