terça-feira, 31 de dezembro de 2013

Este ano


























Este ano cresceu de joelhos 
a noite conservou as quatro luas 
as crianças têm os seus cabelos 
seus gritos de paz intransmissíveis

Luiza Neto Jorge
Terra Imóvel
1964, ed. Portugália
fotografia minha (Âncora, Agosto 2013) sujeita a um filtro do Instagram

quinta-feira, 26 de dezembro de 2013

Os catacteres góticos


é preciso precipitar o conhecimento da doença.
_entretanto muita nobreza e saltimbancos
como algas que a águas esbofeteia.
a matéria adultera-se dia a dia
recua a cartilhagem ocre das árvores
como uma sonoridade agressiva e impotente.
trompa anal do vento (vergonhas de gente com vergonha)
a ração descorada da tua pele de pêssego e de fases solares.

a primavera chega porque os fariseus a fazem fermentar
abre a boca e fecha os olhos faisões passeiam sobre os fruncos.
a manicure esfrega as pernas friorentas
e sugere um pouco mais de meiguice e má-vontade.
bendita a terra estéril e surda que não lhes paga.

letra e espírito das flores do desmaio.

Regina Guimarães
Abaixo da Banalidade, Abastança
1980, ed. Hélastre
pintura de Anne Bachelier

«É bom viver na terra?»


No parque, sobre a relva,
onde é tudo tão difuso,
eu não tenho relação
com a minha vida. Indistinto
entre as dezenas de pontos

que um mestre desconhecido
distribui por acidente
na tela crua da sorte,
não tenho nome ou idade,
nem sequer um coração

para sofrer outra ofensa:
nunca desci ao inferno
de um amor desenganado,
nada perdi que me fosse
precioso ou necessário

e de resto não conheço
os quatro cantos do medo,
nem tão-pouco me pertence
este modo de estar só
que inventei sem querer.

De seguro, por agora,
só tenho o corpo que ofereço
ao calor da primavera _
e nem me custa ser eu, se sou
também qualquer homem

de qualquer tempo e lugar
que alguma vez se deitou
sem cuidados ou remorso
entre as árvores enfeitadas
pela breve luz da tarde.

Rui Pires Cabral
Oráculos de Cabeceira
2009, ed. Averno
pintura de Yuri Leonov

O excesso da criação




















A penumbra é o movimento do poeta
atravessando a obra. Em cada poro
a sua respiração está na folha
entre a nervura do dedo pequenos sinais
despontam na visibilidade da terra

há uma seara extensa na penumbra
filamentos de rio, rosas
figuras móveis do meu corpo abrindo
todo se converte em folha
folhas, pedaços de lua, longe
mas está no movimento do poeta
multiplicar as sombras
que são o excesso da criação.

Rosa Alice Branco
Monadologia Breve
1991, ed. Limiar
desenho de Francesco Balsamo

quarta-feira, 25 de dezembro de 2013

Passo num gesto


























Passo num gesto que eu sei
Deste mundo agoniado para o espaço
Onde sou quanto serei
No tempo que sobra escasso

No outro mundo sou rei
E o meu rosto de cristal e puro aço
É o espelho que forjei
Com suor pena e cansaço

E se o mundo que deixei
Tem as marcas desenhadas do meu passo
São baralhas que enredei
São teias e vidro baço

Tantas provas cá terei
Tantas vezes do pescoço solto o laço
Se me sangraram em rei
Aceitem a lei que eu faço

Vem a ser que o homem novo
Está na verdade que movo

José Saramago
Provavelmente Alegria
4a edição, Caminho, 1998
imagem de Miguel Leal

terça-feira, 24 de dezembro de 2013

Fuck Christmas I Got the Blues



Letra de Paulo Furtado
Do álbum 'Fuck Christmas, I Got the Blues' (2003)

domingo, 22 de dezembro de 2013

Memorial Temporário #2




''As virtudes da desadequação'', um texto meu sobre os Mumford & Sons que podem ler aqui.


terça-feira, 17 de dezembro de 2013

Lana del Rey feat. Cedric Gervais: Summertime Sadness




Letra de Lana del Rey e Rick Nowels
Do álbum 'Born to Die' (a versão original)


(...)
Oh, my God, I feel it in the air
Telephone wires above are sizzling like a snare
Honey, I'm on fire, I feel it everywhere
Nothing scares me anymore

Kiss me hard before you go
Summertime sadness
I just wanted you to know
That, baby, you're the best
(...)

segunda-feira, 16 de dezembro de 2013

[Isto é o meu corpo]
























Isto é o meu corpo
isto é o meu sangue
a miséria sexual das missas
é a miséria sexual das discotecas
mas este e o melhor tempo
de sempre
ainda muito puritano
e nada pudico
é um tempo obsceno
mas dantes era muito mais obsceno
que farei eu com esta espada?
uma foice e um martelo
oulseiras anéis e gargantilhas
que farei eu com o meu eu?
bavarder bavarder bavarder
(que farei eu com este livro?
outro livro ainda o mesmo
que farei eu com este piano?
improvisos
que farei eu comigo?
ergo-me sento-me deito-me
e faço-me
que cada um tenha a sua casa
que cada um tenha o seu piano)

Adília Lopes
A Mulher-a-Dias
2002, ed. &etc
imagem de Christopher McKenney

sexta-feira, 6 de dezembro de 2013

Memorial Temporário #1


''A expropriação da realidade'', um texto meu sobre o tríptico ''Plot Point'' do realizador belga Nicolas Provost, aqui.