terça-feira, 8 de fevereiro de 2011

Masters of Horror: Pro-Life de John Carpenter (2x05)

MÃE-CORAGEM


Faça o que fizer e esteja onde estiver, John Carpenter é sempre John Carpenter. O que significa que é sempre o Mestre do Horror por excelência. Digo "por excelência" pois ninguém como Carpenter consegue tão bem pegar no género "terror" e transformá-lo sempre em coisas originais e, em última análise, válidas também noutros sentidos, nomeadamente, o sentido político que caracteriza filmes como "Prince of Darkness" (1987), "Village of the Damned" (1995) ou "Ghosts of Mars" (2001); ou então o sentido ensaístico, sobre arte, religião ou História, como em "Prince of Darkness", "In The Mouth of Madness" (1995), "Vampires" (1998), "Ghosts of Mars" ou "Cigarette Burns" (2005) -sendo este último precisamente um dos episódios da primera época de "Masters of Horror".


Repetente na segunda época, Carpenter apresenta-nos este "Pro-Life". Apesar do argumento pertencer a Drew McWeeney e Scott Swan, sentimos, logo desde o início, a impressão digital de Carpenter, não só pela natureza da história, carregada de sentidos políticos e até religiosos, quer pelas características da realização.
"Pro-Life" é a história de Angelique Burcell (Caitlin Watches), uma rapariga que nos aparece a correr pela floresta, fugindo de alguém. Na estrada, é quase atropelada por Alex O'Shea (Mark Feuerstein). Alex é na verdade, um médico, que se encaminha para a clínica onde trabalha, e leva Angelique consigo, para ser analisada. Angelique acaba por explicar que Deus a terá levado ao caminho do médico para que ele a ajudasse a abortar.
Quando, já na clínica, Alex analisa Angelique e lhe pede que explique as razões por que quer abortar, cedo percebe que a rapariga estará muito perturbada, pois a sua barriga aparenta pelo menos três meses de gravidez, enquanto ela explica que engravidara há menos de uma semana.
Paralelamente, o pai de Angelique, Dwayne Burcell (Ron Pearlman), aproxima-se da clínica para trazer a filha, menor. Aqui entendemos que Dwayne tem na realidade uma sentença do tribunal que o impede de estar na clínica de aborto, pois, ao que entendemos, ele estaria ligado a movimentos religiosos contra o aborto, e teria tentado vandalizar a clínica.
Dentro da clínica, a barriga de Angelique cresce a um ritmo vertiginoso, e a ressonância magnética dá também indícios de a história de Angelique não ser mentira. De facto, a rapariga explica que havia sido violada por um monstro demoníaco, insistindo que teria que abortar.
No entanto, chega ao ponto em que está pronta a dar à luz, sendo já impossível abortar. Enquanto isto, Dwayne e os três filhos invadem a clínica, acabando por barricar o director dentro do gabinete, assassinando-o com requintes de sadismo.
Angelique dá à luz o seu monstro, e o pai desse monstro irrompe pela clínica.
Este filme está, de facto, cheio de pequenas subtilezas políticas, nomeadamente as ligadas ao aborto. Carpenter parece investido em demonstrar que manter uma gravidez a todo o custo pode dar mau resultado, como aqui acontece. Poderemos entender "Pro-Life" como uma parábola sobre esta questão. Afinal de contas, Angelique está grávida de um ser indesejado, e está investida a nem lhe dar vida. Quando confrontada com a impossibilidade de um aborto, Angelique acaba por matar o recém-nascido. No fundo, podemos entender que uma mulher grávida de um filho que não deseja, não o matando em estado fetal, acabará por fazê-lo depois, ainda que não literalmente, pois há muitas maneiras de matar sem necessariamente cometer homicídio, ou infanticídio.
O que neste filme há de grotesco também contribui para gerar em nós uma certa repulsa e um incómodo muito conveniente.
Também aqui Carpenter mantém um pouco a sua vontade de fundir o terror com o western, o que é particularmente evidente na invasão de Dwayne e dos filhos à clínica.


Tal como acontecia com "Cigarette Burns", o que nos chateia em "Pro-Life" é sentirmos que havia aqui material suficiente para fazer uma longa.
A realização de Carpenter é, como sempre, garrida, com uma noção muito adequada do tempo que cada sequência precisa; com grande atenção às formas de mostrar o espaço -este é, afinal, um filme muitíssimo arquitectónico-; e com criação de grandes tensões, quer entre os actores, quer entre eles e o desenrolar da história.
Uma vez mais, Carpenter prova-nos que ninguém como ele sabe resgatar o termo "terror" do aborrecimento em que ultimamente o género tem caído.


1 comentário:

Anónimo disse...

O problema é a falta de patrocínio pra fazer um longa, o gênero horror verdadeiro parece não ter mais valor artístico.
Mas o malafaia tinha que assistir esse filme. kkk