Se em 2002 muitos supostos engraçadinhos lhe chamavam Snorah Jones, ao quatro disco, Norah definitivamente não snorah. Nem perto disso.
"Come Away With Me" é um álbum irrepetível. Contém canções que certamente estarão entre as melhores da década que agora termina, canções como "I´ve Got To See You Again", "Seven Years", "Don´t Know Why" ou "Lonestar", que fizeram de Norah Jones uma verdadeira e estrondosa revelação, ela que era afinal cantora de uma música tão serena. Além da música em si, "Come Away With Me" representou também um verdadeiro fenómeno a nível do reconhecimento, em particular com a aquisição de oito Grammies ("Limpando" assim as mais importantes categorias: Melhor Álbum do Ano, Melhor Artista Feminina, Melhor Canção para "Don´t Know Why", Melhor Disco, Melhor Álbum Pop, Melhor Artista Revelação, além dos prémios de produção.) juntando-se assim a "The Miseducation of Lauryn Hill" e a "Songs in A Minor" de Alicia Keys.
"Feels Like Home", lançado em 2004, quando o boom do primeiro álbum ainda estava recente, no entanto, pareceu-me um disco mal sucedido neste aspecto: ele não representava nenhuma especial evolução desde o primeiro, preferindo jogar pelo seguro, mantendo-se demasiado na sombra de "Come Away With Me".
Em 2007 foi a vez de "Not Too Late". O título era significativo: de facto, não era tarde para recuperar o tempo perdido, ou a evolução pedida. "Not Too Late" continha já algumas canções a merecerem referência, afastando-se da matriz do primeiro álbum para um registo mais pop e menos jazz-infused. Neste álbum surgiam com já alguma importância linhas de electricidade, e arranjos mais elaborados. No meio de tudo isto, uma canção a ser lembrada: "Thinking About You".
O lançamento do álbum de 2009, este "The Fall" vem finalmente esclarecer-nos: Norah mudou mesmo de trajecto. Uma coisa me parece evidente: "Not Too Late" e "The Fall" formam uma espécie de díptico: onde o primeiro avança cautelosamente, o segundo arrisca-se totalmente. E é bem sucedido.
"The Fall" abre com "Chasing Pirates", uma canção que, em termos de letra, poderá fazer lembrar um tanto o alheamento infantil que Norah já mostrava no seu segundo álbum. Esta é uma das canções mais significativas do novo álbum, porque resume um pouco aquilo em que consistirá o novo álbum: são as linhas de piano eléctrico que já encontrávamos em "Not Too Late" e que nos remetem para uma espécie de smooth-jazz-pop, mas agora acrescidas de baterias com ritmos muito marcados e de vocalizações expeditas e enérgicas, definitivamente diferentes daquilo que estamos habituados a ouvir em Norah Jones.
Há também um reparo que, a meu ver, sempre fez sentido, mas que com o novo álbum se torna realmente óbvio: é que, apesar dos Grammies na categoria pop, Norah Jones nunca foi uma cantora pop, e muito menos em "Come Away With Me". Em "The Fall", ela também não é exactamente pop, mas encontra-se bastante mais próxima do que em qualquer outro momento da sua discografia. Quando digo pop não me refiro a um universo de Britneys ou Lady Gagas, refiro-me a uma pop na tradição de Kate Bush, Allison Moyet ou Sarah McLachlan: dessa pop, que hoje é mais alternativa, é que podemos aproximar Norah Jones. "Even Though", que se segue, está ainda dentro do mesmo registo, e é também uma das melhores canções do álbum. "Light as a Feather" no entanto é que vem introduzir mais um elemento a este álbum: a capacidade que Norah tem de repescar a melancolia que se notava nalgumas das suas grandes canções, e o seu tom sussurrante e usá-los mesmo numa composição que se afasta dessas. Por assim dizer, Norah vai procurar naquilo que já fez e volta a fazer de uma maneira muito diferente, pondo de certa forma à prova o seu estilo, testando-lhe a resistência à mudança. Está visto que consegue. "Light As a Feather" parece-me ser uma das melhores canções de "The Fall".
"Young Blood", que será outra das melhores canções deste disco, é a derradeira confirmação daquilo que as primeiras canções já afirmam: que a música de Norah está perfeitamente equilibrada, porque o que perdeu em calma ganhou em energia, e a cantora é perfeitamente capaz de acompanhar.
A melhor canção, mesmo assim, parece-me ser "It´s Gonna Be" com o seu piano eléctrico e a beat piscando o olho a uma excelente composição rock, com uma letra muito política. É, de todos, o momento mais invulgar e inesperado de "The Fall".
Se há alguma canção que relembre particularmente o passado, será "You´ve Ruined Me". E mesmo assim, se formos fazer uma ponte ela irá, no máximo, até "Feels Like Home", não chegando à calmia de "Come Away With Me".
De assinalar são também canções como "Stuck", "I Wouldn´t Need You" (Uma das melhores letras do álbum.), "Back To Mannhatan", o interessante arranjo de piano de "Waiting"
Será talvez de realçar o facto de neste álbum, tal como no anterior, Norah ser autora ou co-autora de todas as canções (Ao passo que nos primeiros dois álbuns escrevia muito poucas canções.), não dispensando no entanto o contributo de músicos como Jesse Harris ou Lee Alexander, que a acompanham desde o início.
Acima de tudo, "The Fall" é uma tentativa de criar "outside the box". E se Norah Jones arrisca largamente, é também largamente que consegue um bom resultado. Por essa razão me parece que "The Fall" não deixa de ser o mais digno sucessor de "Come Away With Me", pelo menos no que toca à música. A edição de coleccionador será de aproveitar, pois contém nada menos que seis canções ao vivo.
It´s Gonna Be
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