Chego agora a casa do concerto dos The Gift no Tivoli. Com datas a serem acrescentadas aos dois concertos originalmente planeados, há que dizer que tive sorte, pois, em terem-se feito apenas esses dois, eu não poderia assistir a nenhum. Ainda bem que assim não foi.
Quem tiver lido o texto que escrevi acerca de "Explode", há bem pouco tempo, terá percebido que, ainda que eu ache tratar-se de um grande álbum, tinha em relação a ele algumas reservas. E, se este concerto teve uma coisa boa é que me dissipou essas reservas.
Agora posso afirmar sem sombra de dúvida que estas canções são realmente boas e que os The Gift estão numa muito boa fase do seu percurso.
Confesso que achei a escolha de "Aquatica" para abertura do concerto bastante arriscada. Ainda que a canção esteja longe de ser uma das mais marcantes de "Explode", há que reconhecer que os Gift souberam dar-lhe a volta e torná-la uma boa introdução para o que se seguiria.
Uma das dúvias com que eu ficava relativamente a algumas (Só algumas.) canções do álbum era se não monosprezariam a voz de Sónia Tavares. Claramente não é o caso, e, ao vivo, ela ganha a devida relevância, pois trata-se de uma voz fortíssima e de um extremo perfeccionismo, e, entre nós, ainda uma voz nova, mesmo passados tantos anos.
"RGB" surpreendeu por surgir tão cedo no alinhamento, pois, tratando-se de uma espécie de cartão de visita de "Explode", seria de esperar que fosse tocado mais tarde (E sê-lo-ia, em repetição, no segundo encore.), mas era exactamente a canção necessária para espicaçar um pouco o público já que "Aquatica" é, mesmo assim, uma canção mais serena.
Seguiu-se "My Sun" que foi a única em que se sentiu uma certa deficiência sonora, na voz de Nuno Gonçalves, que soava pouco nítida. Fora essa ocasião, não me pareceu haver problemas a assinalar. "My Sun" seguiu bastante a linha de "RGB", com um ritmo contagiante que, mesmo num concerto com lugares sentados exclusivamente, fica sempre bem.
"Suit Full Of Colours" está mais na linha de "Aquatica" e é interessante que surja na parte ainda inicial do concerto pois, pelo menos a nível da letra, parece ser bem representativo da nova fase dos The Gift, ainda que, em termos de música, seja mais melancólica do que a maioria das canções que agora nos são propostas.
Depois disto, lançaram-se em "Primavera", canção cantada em português, sendo que Sónia Tavares teve o cuidado de relembrar que essa escolha de gravar em português é tudo menos recente (Relembremos "Ouvir", que pertencia a "Vinyl", o álbum de estreia.). O primeiro retorno ao passado veio a seguir, com "Fácil de Entender", louvavelmente tocado na sua versão original, apenas com voz e piano.
Ainda em regressos ao passado, seguiu-se "645", um dos dois originais de "Fácil de Entender" que, assim se confirma, anunciava já a mudança de percurso que "Explode" representaria. Escusado será dizer que foi um dos melhores momentos da noite, e aquele em que, finalmente, o público se levantou.
Depois disto, regressou-se, de vez, a "Explode", com "Made For You", que, acrescento, soa muitíssimo melhor ao vivo do que em estúdio (Mas muito melhor mesmo.), o mesmo se passando com "Mermaid Song", que aqui se torna mais perceptível, principalmente no que ao ritmo diz respeito.
"Race Is Long" era já um dos melhores momentos do álbum, e ao vivo manteve-se como um dos pratos fortes, notando-se uma grande aderência do público.
Aquela que, para mim, é a melhor canção de "Explode" e, possivelmente, a melhor canção de sempre dos The Gift, "Always Better if you Wait for the Sunrise", foi guardada para o fim do concerto, tendo Sónia Tavares assinalando, entre brincadeiras sobre os The Cure, que ela marca o lado melancólico que, justiça se faça, sempre foi uma parte crucial da música dos The Gift. Como disse, foi a canção que mais me chamou a atenção em "Explode", mas aquilo que ganha ao vivo é indescritível. Torna-se evidente que se trata de uma canção infinita, riquíssima e realmente inesquecível. Para mim, foi também o melhor momento de uma noite que, mesmo assim, não foi parca em momentos memoráveis.
Para o primeiro encore, ficaram "Let It Be By Me", a abertura do álbum e que, ao vivo, parece ainda mais astronómica e "The Singles", a famosa canção de 12 minutos, cheia de mudanças de ritmo e de estrutura. Ao vivo, tem o condão de parecer ainda mais bem articulada.
Para o segundo encore ficou a repetição de "RGB" que, pela atitude finalmente frenética do público, foi bastante melhor que a primeira interpretação, no início do concerto.
Momentos destes relembram-nos por que os The Gift são uma das nossas bandas mais originais e mais criativas e mais capazes de fazer de um concerto um momento forte.
Outro reparo que quero fazer: dizia eu no texto sobre "Explode" que, ao princípio, nos poderia parecer que este álbum assumia com mais facilidade as suas influências. Dizia no mesmo texto, no entanto, que uma audição mais atenta nos mostraria que assim não era. E, de facto, ao vivo, isso entende-se ainda mais claramente. Notamos aqui a mesma dinâmica de sempre dos Gift e quem, como eu, os acompanha desde o princípio, percebe isso muito facilmente. No fundo, nunca se repetiram, e continuam a apostar nisso. Palmas para eles.
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