Redes sociais como o Facebook, ainda que para mim apresentem sempre inúmeros senãos, têm de vez em quando algumas vantagens interessantes. A circulação de novas propostas a nível das artes é uma delas. Diga-se de passagem que não é uma vantagem pequena. De facto, a divulgação que existe para artistas emergentes é agora muito mais fácil e directa, na medida em que se tornou obsoleto existir um crítico que fale deles.
Ontem à noite, sem que eu percebesse muito bem como, aparece-me na barra lateral a página de uma banda de progressive-rock filandesa chamada The Chant.
Atraído pela descrição, decidi procurar. Encontrei então registo do segundo álbum, lançado no final de 2010. Tem o interessante título "This is The World We Know".
Outra vantagem dos tempos modernos e da internet é que há maneiras de, em cerca de 20 minutos e completamente à borla, ter um álbum inteiro no computador pessoal.
Assim sendo, em menos de meia hora, conheci uma banda nova e adquiri o álbum deles. E ainda bem. Como sou um pouco paranóico, acho que o progresso científico acabará por destruir o mundo, colocando-o nas mãos de uns poucos que nos dominarão, acabando por, no fim, sucumbir como os outros. Posto isto, sou absolutamente conta o progresso científico.
Mas todas as regras são confirmadas pela excepção.
E, sobre os The Chant, só digo: GRAÇAS À CIÊNCIA PELA INTERNET.
"This is the World we Know" abre com "New Reality". É uma boa abertura, na medida em que, para começar, é uma canção bastante comedida, e por outro lado, é também bastante eloquente no que toca aos objectivos musicais da banda. Percebemos aqui um conhecimento profundo do gothic metal e do doom metal, mas não a pretensão de se inserirem nesses géneros. O termo progressive rock é realmente o mais adequado. A incorporação de determinadas características mais ligadas ao metal neste tipo de sonoridade requer ou muita experiência (Que foi, por exemplo, o caso dos Anathema, que só o conseguiram plenamente ao quarto álbum.) ou então uma postura mais arriscada, baseada na experimentação, que parece ter sido a escolha dos The Chant. Assim sendo, não é estranho que aqui encontremos ecos ligeiros de A Perfect Circle, de Anathema (Não exactamente de Anathema, mas do "Judgement" (1999) dos Anathema.) ou de Tool, além dalguns clássicos, como os Dead Can Dance ou os Bauhaus.
Mas, e será isso que há de mais interessante aqui, é que os The Chant não ficam pela lição dos mestres. Há em "This is the World We Know" algo de muito original.
Como disse, "New Reality" parece-me ser uma canção comedida, no sentido em que é contida, controlada.
Logo em "Reflected" esse auto-controlo parece dar lugar a uma maior liberdade. Assim, vemos com mais nitidez a estrutura que sustém estas canções, muito mais dependente da guitarra eléctrica do que propriamente do baixo e da bateria. A qualidade dos arranjos é também aqui mais clara.
Logo em "Reflected" esse auto-controlo parece dar lugar a uma maior liberdade. Assim, vemos com mais nitidez a estrutura que sustém estas canções, muito mais dependente da guitarra eléctrica do que propriamente do baixo e da bateria. A qualidade dos arranjos é também aqui mais clara.
A voz de Ilpo Paasela é interessante e bastante capaz de acompanhar a atmosfera das canções, que por norma é angustiante e meditativa.
"November 1987" mostra também de uma forma bastante clara a referência ao metal que há nesta banda. Os segmentos instrumentais são executados com minúcia, assumindo uma certa inclinação para o lado barroco e complexo, mas sem exageros.
Tanto em "The Black Ascencion" como em "Will You Follow?" notamos também a importância do piano, tocado maravilhosamente por Mari Jämbäck, a única mulher da banda, assume também um lugar estrutural e orientador, evidenciando nas composições a tendência clara para o dramatismo.
Em "Will You Follow" encontramos também o deslize ligeiro para o doom-metal, que não soa nem pretensioso nem deslocado, mas perfeitamente lógico e bem construído.Os dois guitarristas da banda, Kimmo Tukiainen e Jussi Hämäläinen mostram-se também muito competentes em acompanhar o esquema complexo que as canções vão tomando, sendo que esta "Will You Follow" é o melhor exemplo da dinâmica que existe entre os músicos, em que cada instrumento tem momentos de protagonismo, conjugando-se depois tudo numa canção a que não falta nada para ser épica.
"Safe World" segue a mesma lógica de "Will You Follow" e, com ela, forma também o cerne do álbum, sendo outra das canções mais complexas, com uma construção que funde perfeitamente o lado sinfónico com o lado rítmico acrescidos ainda de momentos de explosão e momentos de pausas, deambulando a voz entre tudo isto, confundindo-se por vezes maravilhosamente com os próprios instrumentos.
Em "Common Price" voltamos a encontrar o piano como elemento orientador. Trata-se de uma das canções, apesar de tudo, mais serenas de "This is the World We Know", onde encontramos uma espécie de oscilação entre luz e trevas, algo muito semelhante à respiração, de resto.
"Armored Man", pelo contrário, assume esta oscilação como algo de drástico, movendo-se de um extremo ao outro, entre partes sussurradas e fantasmáticas e partes de uma impressionante guturalidade e violência. Fará parte, também, do conjunto das melhores canções do álbum.
A fechar, encontramos "Relativity", canção de um ritmo inesperado, naquilo que tem de sincopado, mas também canção de uma tonalidade mais leve do que todas as outras canções, com excepção de "New Reality", o que me leva a concluir que "Relativity" é uma boa canção para terminar pois, em contraponto á primeira, forma realmente um ciclo, ainda que esta seja bastante melhor do que a primeira, precisamente no sentido em que aqui sentimos o tudo-por-tudo. É uma canção tensa e que parece ser completa, na medida em que sintetiza em si todos os sentimentos, o que se consegue também muito à custa de várias alterações de ritmo e de esquema instrumental.
"This is the World We Know" é um álbum curto, mas muito conciso. Não lhe acrescentaria nada e nem lhe retiraria nada. É inesperado que uma banda que vai apenas no seu segundo álbum seja capaz de criar canções desta qualidade, mas elas aqui estão, perfeitamente capazes de ombrear com os nomes mais importantes do género de música que tocam. Vaticínios aparte, o que nos trarão futuramente os The Chant não sei, mas "This is the World We Know" é certamente um disco rock de primeira água. E isso é já suficiente.
(acima, "Armored Man")
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