Seria praticamente impossível falar de filmes de terror sobre o sobrenatural, uma das categorias mais aclamadas do género, sem referir o nome do realizador de origem italiana Dario Argento. Desde 1970, Argento já nos deu filmes tão inacreditáveis como "Profondo Rosso" (1975), "Suspiria" (1977), "Phenomena" (1985), "Non Ho Sono" (2001) ou "The Mother of Tears" (2007).
A média-metragem com que participou na primeira época de "Masters of Horror" é este interessantíssimo "Jenifer". Sendo um filme com algo de sobrenatural, esta classificação, como sempre, revela-se um tanto insuficiente para o definir. Não se trata também propriamente de um filme de zombies, mas o esquema não é completamente alheio a este filme, escrito a partir de uma história de banda-desenhada de terror dos anos 70.
É a história de Frank Spivey (Steven Weber- que é também argumentista da película.), um polícia que, durante uma patrulha salva das mãos de um sem-abrigo louco uma jovem rapariga, que o sem-abrigo diz chamar-se Jenifer (Carrie Anne Fleming). A rapariga, totalmente desfigurada no rosto, apesar do corpo belo, acaba por ser internada num asilo psiquiátrico. Comovido, Fank acaba por levá-la para sua casa, apesar da relutância da mulher e do filho. Jenifer aparenta ser verdadeiramente atrasada mental, pois mais não consegue que grunhir e gemer e enrolar-se num canto como um animal. Até que seduz Frank, que começa a ter relações sexuais com ela pontualmente. Cedo descobre também que Jenifer parece sobreviver comendo gatos e crianças. Após o incidente do gato, a mulher e o filho de Frank abandonam a casa e, depois de Jenifer devorar a vizinha de oito ou nove anos, Frank foge com ela algures para o meio da selva.
É no meio desta sensação de inevitabilidade que Frank se encontra absolutamente incapaz de fugir a Jenifer, tanto quanto sentimos que o seu fim será algo semelhante ao que acontecia ao sem-abrigo no início do filme.
Na verdade, Argento consegue em "Jenifer" planos belíssimos e bizarros, capazes de se equiparar com o seu restante trabalho. Foge também à maioria dos clichés que este género de filme parece impingir, e facilmente se desvia de qualquer predicabilidade, seguindo uma narrativa que pode ser estranha mas não deixa de ser lógica.
Não é um filme particularmente gore, ainda que certos planos não tenham dificuldade em causar-nos um esgar.
A figura de Jenifer é excelentemente caracterizada, sendo que, a certa altura do filme, já desistimos de tentar entender a sua origem ou o seu passado: percebemos que Argento, como os grandes mestres do terror, está mais interessado em mostrar-nos o Mal no seu estado puro, que, tal como o suposto Deus, foi "gerado e não criado".
No entanto, e será isso que nos deixa a pensar no fim do filme, não é claro se estamos perante uma criatura que é apenas uma personificação do Mal ou se estamos simplesmente perante o instinto de sobrevivência de qualquer predador. Pergunto-me se a opção de fazer de Jenifer uma atrasada mental não poderá contribuir para que ela acabe sendo susceptível da nossa pena ou da nossa compreensão: se assim é, a ideia de nos confrontar com o Mal e até com o instinto assassino fica um tanto ao quanto desfavorecida.
Àparte disso, tudo em "Jenifer" parece bater certo. Argento prova uma vez mais que ainda é um expert no que toca a fazer filmes de zombies ou de quase-zombies, que resulta no mesmo.
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