quinta-feira, 29 de julho de 2010

Lou Rhodes: One Good Thing

VÁRIAS COISAS (MUITO) BOAS

Em 2004, os Lamb lançavam "Best Kept Secrets (1996-2002)", uma colectânea que reunia algumas das canções mais marcantes dos quatro álbuns da banda. Dois anos depois, Lou Rhodes apresenta-se em nome próprio com "Beloved One".
A primeira sensação natural seria a estranheza. O que nos Lamb era complexidade e quase excesso, dava lugar a uma simplicidade intimista nas canções de Lou. O seu primeiro álbum a solo era uma colecção de canções melódicas e depuradas, numa sonoridade folk, que contavam com pouco mais que uma guitarra acústica, uma bateria e um baixo, praticamente o inverso do som fervilhante dos Lamb.
O que "Beloved One" afirmava, "Bloom", em 2007, confirmava. Lou apresentava-se agora com uma banda onde ocasionalmente ouviamos alguma electricidade. Mas era um facto: os conceitos do primeiro álbum continuavam ali, ainda que numa roupagem distinta.




Em 2010, Lou presenteia-nos com "One Good Thing". Este terceiro trabalho deveria ser o suficiente para começarmos a ouvir Lou Rhodes e deixarmos de ouvir a ex-vocalista dos Lamb.
"One Good Thing" representa mais um passo na maturidade musical de Lou. Ouvimo-la agora num registo que está um pouco ancorado no meio-termo entre os seus primeiros dois álbuns. Não é o quase minimalismo do primeiro mas também não é o som mais polido do segundo.
Estas canções são tocadas pela habitual guitarra de Lou, com acrescentos de percussão e cordas. A luminosidade que ouvíamos frequentemente nos primeiros álbuns dá agora lugar a uma densidade que tem algo de mais "negro". Não raro encontramos neste álbum letras que nos colocam frente-a-frente com o mundo, o nosso mundo. Não são já as canções simples de amor, há nestas algo de mais semelhante ao percurso do indivíduo que procura o seu lugar no mundo: o amor é só mais um dos caminhos que se pode tomar para isso.
O álbum abre com "One Good Thing", que reflecte um pouco a situação política actual. É talvez a canção mais próxima de "Bloom", assim como "Magic Day" estará mais ancorado em "Beloved One". Outras como "It All" ou "Circles" parecem-me mais representativas da fase actual de Lou: são canções pesadas, de melodias violentas, que contrariam a tendência para se pensar que o que é simples é suave. Muito pelo contrário, Lou não vacila no esquema de construção das suas canções o que não a impede de criar canções tristes.
Outros dos pontos que interessa sempre assinalar quando se fala de Lou Rhodes é a questão da voz; talvez porque esse será ainda o interesse maior da sua música. Estamos perante uma das vozes mais invulgares e belas da música actual, e "One Good Thing" é, até agora, o álbum que melhor explora a potencialidade da voz: ouvimos Lou perfeitamente desenvolta nos vários registos que compõe (Lembremos que o material que canta é exclusivamente da sua responsabilidade.), e notamos ao longo do álbum várias nuances. Ainda que pareça contraditório com o que afirmei no início deste comentário, a verdade é que este é o álbum vocalmente mais se aproxima dos Lamb. Note-se que não pretendo insinuar qualquer demérito à banda de Lou e de Andy Barlow, que mesmo depois do seu fim continua a ser uma das minhas favoritas: o caso é que, apesar de notarmos um registo diferente com Lou a solo, aos Lamb deve ela um género de música que sempre lhe permitiu movimentar-se nas mais variadas tonalidades, desde o choro lento que é "Goreki" à agressividade de "Little Things" ou à brutal explosão de "Till The Clouds Clear". E se em "Beloved One" ou "Bloom" aquilo que mais ouvíamos era a suavidade e a melancolia, neste álbum ouvimos já sentimentos mais violentos, como acima referi, e que não se limitam às composições: são transpostos para a voz, e é essa a novidade, em termos vocais, de "One Good Thing". Neste álbum, ouvindo por exemplo "It All", quase não parece a mesma voz que depois ouvimos em "Melancholy Me".



Também importa fazer um contraponto entre o registo em álbum e o som ao vivo. Não ao acaso, "One Good Thing" parece-me ser o que mais aproxima os dois; e este é um álbum justamente gravado em directo, em live takes, o que me parece uma decisão muito acertada: note-se que no tempo de "Beloved One" Lou tocava em estúdio com poucos músicos e essa sonoridade tornava-se diferente ao vivo, onde tocava com uma banda inteira; já em "Bloom" Lou tocava com uma banda inteira e várias vezes se apresentou em palco sozinha com a sua guitarra. Se por um lado se notava uma diferença abissal entre os álbuns e os concertos, por outros não deixava de ser inteligente essa forma de pôr as canções à prova mudando-lhes o esquema instrumental. Mesmo assim, "One Good Thing" parece distanciar-se dessa ideia e dar em estúdio um som muito aproximado ao que se ouviria em palco.
Este é, acima de tudo, um álbum de grandes canções. A destacar algumas, eu destacaria "It All", "Circles", "There For The Taking" ou "Melancholy Me": parecem-me as canções mais desenvoltas, mais realmente novas, ainda que seja difícil encontrar neste álbum canções que não tenham algo de insólito a merecer referência, pelo que o que recomendaria mesmo seria que se ouvisse o álbum na íntegra.



One Good Thing

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