terça-feira, 14 de agosto de 2012

Halloween II de Rick Rosenthal

O CAPÍTULO DAS REVELAÇÕES
 
Estreada em 1981, a primeira sequela de 'Halloween' conta ainda com uma participação próxima de John Carpenter e de Debra Hill, que regressam como argumentistas do filme que dá continuação ao ataque na noite de Halloween de 1978. É uma opção interessante, a de situar cronologicamente o segundo filme na mesma noite que o primeiro, uma vez que, logo à partida, uma continuação tão próxima temporalmente permite que se acrescentem mais detalhes à história original, as revelações, sem que pareça forçado. Mais ainda, este filme beneficia muito, e isso vai ser notório, do envolvimento próximo dos autores do primeiro, o que é uma forma de manter a rédea curta ao novo filme, já que é sabido, por força de tortuosos exemplos, que as sequelas tendem a arruinar os filmes originais com facilidade, acrescentando-lhe todo o tipo de detalhes inusitados e sem sentido, cuja intenção não é adensar a história da saga, mas sim justificar, e muitas vezes malíssimamente, a produção de mais um filme.
 
 
O caso de 'Halloween II' não será bem esse.
Uma vez que Carpenter não quis realizar a sequela do seu filme de 1978, o realizador a quem coube essa tarefa foi Rick Rosenthal, que hoje será talvez conhecido pelo seu trabalho mais ligado á televisão (Em séries como 'Buffy the Vampire Slayer', 'Law and Order' ou 'Smallville', entre outras.), mas cuja estreia foi precisamente este filme.
A sinopse prossegue a partir do desaparecimento de Michael Myers, depois de ter sido alvejado seis vezes pelo seu psiquiatra, o dr. Sam Loomis (Donald Pleasence), acompanhando a busca do médico pelo seu antigo paciente, ao mesmo tempo que mostra o choque da comunidade de Haddonfield ao saber do massacre, e acompanha ainda Laurie Strode (Jamie Lee Curtis), a única sobrevivente, até ao hospital da vila. Escapando no entanto à perseguição, Michael consegue chegar ao hospital, matando ainda algumas pessoas pelo caminho, claramente interessado em chegar a Laurie.
Ao passo que o filme de Carpenter se centrava essencialmente no percurso de Michael, feito pela sombra, até chegar às suas vítimas, numa espécie de celebração do seu primeiro homicídio, cometido aos seis anos; o filme de Rosenthal centra-se muito mais na perseguição da polícia e do psiquiatra, que tentam desesperadamente travar o assassino. Assim, os dois filmes formam uma espécie de relação de causa/efeito entre si, constando no primeiro o massacre e, no segundo, os resultados desse massacre que, apesar de tudo, ainda não terminou.
Torna-se um tanto difícil ver um filme de uma saga cujos contornos são já por demais conhecidos. No entanto, 'Halloween II' precisa de ser visto no seu contexto, ou seja, esquecendo todas as sequelas que depois dele apareceram.
Quando tentamos ver o filme assim, é inegável que, inicialmente, ele nos parece um tanto gratuito. Michael despacha uma série de pessoas, mas claramente traçando o seu caminho até à única vítima que lhe escapou, o que nos pareceria uma desculpa esfarrapada para filmar mais um massacre, aproveitando o sucesso do filme original. No entanto, não é assim. Carpenter e Hill escrevem o argumento subtilemente preparando-nos para as revelações que já esperaríamos.
Vemos que, no caminho para o hospital, Michael passou pela escola primária onde tinha estudado, deixando escrito na parede SAMHEIN (O nome original do dia 31 de Outubro, quando os mortos revisitavam a terra.) e cravando uma faca na figura da irmã num desenho infantil. Se o primeiro filme já nos vinha dar a entender que era duma espécie de recriação e continuação do primeiro homicídio que se tratava, este filme vem trazer uma justificação para tudo isso. A certa altura, o dr. Loomis é procurado pela enfermeira do asilo psiquiátrico, Marion Chambers (Nancy Stephens), que lhe vem falar de um arquivo judicial sobre Michael Myers que havia sido ocultado do psiquiatra e que o tribunal autorizara a desenterrar devido aos incidentes daquela noite. Nesse documento, o dr. Loomis descobre que Michael tinha uma outra irmã, entregue a outra família durante os quinze anos em que o assassino esteve internado. Essa irmã é Laurie Strode.
Podendo parecer que esta revelação é apenas uma forma de tornar entusiasmante uma sequela, na verdade, tem muito mais valor do que se possa pensar. Ao longo de dois filmes, o psiquiatra parece convencido de que Michael se separou da sua condição humana, sendo, em vez disso, uma espécie de encarnação do Mal. O estabelecer de uma relação familiar entre Michael e Laurie vem dar uma outra dimensão a esta questão. Os homicídios deixam de ser uma forma de argumentar a favor dessa ideia de que Michael seja uma personificação do Mal; e passam a ser o retrato da jornada de Michael para se separar definitivamente da sua condição humana. Se entendermos as relações como aquilo que simbolicamente sustém a nossa condição humana, vemos que as únicas que Michael tem são de sangue. Assim, assassinou Judith aos seis anos, durante o tempo em que esteve confinado morreram os seus pais e volta, depois, para assassinar a outra irmã. Se fosse bem sucedido, passaria a existir sem qualquer tipo de relações, livre de humanidade. Os restantes mortos, além de comprovarem, realmente, a malignidade de Michael, ganham também outra dimensão: sendo, mais ou menos, aqueles que estão em volta de Laurie, eles são como que guardiães dela, tendo Michael que os eliminar para chegar a ela.
 
 
Portanto, o argumento deste filme é suficiente para justificar a sua existência, tendo, de facto, algo a acrescentar à história do primeiro. Relativamente à realização, Rosenthal não tem a sensibilidade exacerbada de Carpenter, mas consegue continuar o original de uma forma bastante competente, conseguindo retirar algumas valiosas lições de Carpenter, sem no entanto se tornar numa cópia falhada. Exemplo dos conseguimentos deste filme são, por exemplo, as perseguições nos corredores do hospital, onde a sensação claustrofóbica de se estar encurralado num labirinto é perfeitamente transmitida, bem como o atordoamento de Laurie, a quem haviam sido injectados vários ansiolíticos. Rosenthal consegue, nessas como noutras cenas ainda, criar a tensão que o argumento exigiria e, assim, manter o espectador num suspense bastante conveniente.
De assinalar é também o regresso de Jamie Lee Curtis, Donald Pleasence e Nancy Stephens interpretarem novamente os seus personagens, conferindo uma continuidade entre os dois filmes que favorece bastante esta sequela. As suas performances são, como seria de esperar, muitíssimo convincentes, e a eles também se deve o conseguimento do filme.
Pode este filme não ser um Carpenter, mas certamente é muito digno de continuar um. E se Rosenthal, mesmo assim, apresenta algumas falhas de principiante, não são essas que se retêm do filme, que tem ainda aspectos bastante positivos que o tornam merecedor de referência e também uma das raras boas sequelas da história das sequelas de cinema de horror.
 
 

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