sexta-feira, 14 de março de 2008

Lovely de Frank Ronan

O ALUCINOGÉNIO

Confesso a minha ignorância, nunca tinha ouvido falar de Frank Ronan, e, se acabo agora de ler “Lovely” é só porque mo emprestaram.
E, não conhecendo a restante obra do autor, é para mim como caminhar em areias movediças estar a falar deste romance. Mas, arriscando-me a dizer asneiras, aventuro-me a comentar uma história que tanto me tocou, precisamente por isso.
“Lovely” é a alucinante história de amor entre Nick e Aaron, dois homens que se conhecem em Goa, no seu ciclo de festas que incluem mulheres chai, álcool, música até de madrugada e vários tipos de droga. Não se trata de um amor á primeira vista, mas de algo que ambos reconhecem como o encontrar de algo que há muito se procurava. Assim sendo, na primeira parte, “O Amor”, é-nos descrita forma como a sua relação germina, numa espécie de mundo onírico em que nada poderá correr mal, pois tudo é apanhar sol na varanda ou na praia, passear com os amigos, viajar de barco e fumar charros até ás tantas da madrugada. Assim, Nick e Aaron dão-se a conhecer um ao outro, o primeiro proveniente de um passado problemático que inclui prostituição e um sem-número de relações mal sucedidas; ao passo que o segundo tem apenas histórias bonitas e quase surrealmente boas, que passam por uma vida em que atingiu tudo o que quis atingir. Estas insignificantes realidades opostas virão a ganhar relevância na segunda parte, “A Vida” em que os vícios de Nick com a droga e o álcool se revelam diários, e não esporádicos, ao passo que o círculo de classe média-alta de Aaron considera o seu novo namorado indigno do amor dele. E, enquanto Aaron se esforça por ajudar Nick, este parece empenhado em dar razão aos descrentes amigos e familiares de Aaron.
Assim, a relação de ambos vai-se destruindo, enquanto fica cada vez mais ténue até para o próprio Aaron se ama Nick ou o que Nick poderia ser, e este último fica demasiado afogado em álcool para permitir que as coisas corram bem, e para permitir a si próprio honrar o amor extremo que tem por Aaron.
Inserido no Dirty Realism de David Leavitt, Jay McInnerney e Raymond Carver, Frank Ronan consegue atingir aquele que é um dos objectivos máximos desta corrente: retratar um tipo de realidade que, mesmo nos dias de hoje (Não devemos considerar um livro de 1996 antigo.) é abordada com muito pudor, ou então não é abordada de todo. É o caso deste romance sobre uma relação amorosa entre dois homens, mas Ronan consegue, ao mesmo tempo, relatá-la sem cair nos lugares-comuns de mostrar como é que uma relação vítima de preconceitos sociais consegue triunfar. Não há rumores de preconceito social aqui. A questão é assumida da forma como (Afirmo.) deve ser assumida: como uma coisa normal. É essa a qualidade principal da narrativa deste escritor: foca-se na realidade íntima destas pessoas, aproxima-se da esfera do inconsciente, e não se deixa distrair por questões paralelas que pouco acrescentariam. Por outro lado, em relação á escrita, é a normal dentro desta tendência essencialmente americana: descrições rápidas (Que deixam um espaço para a imaginação do leitor.), ambientes mais ligados ao underground e uma brutal fluidez de texto que faz dele pouco maçudo e muito empolgante.
Portanto, recomendo.

Veredicto: 18/20

1 comentário:

phelino disse...

Oi como vai,
Sou do Brasil e tenho acompanhado seu blog recentemente e achei muito legal os comentários do livros. Estou querendo dar de presente ao meu companheiro um livro e pensei em pedir-lhe um conselho, já que por aqui é muito dificil achar bons livros do genero e li poucos até hoje. Achei que o Lovely seria uma boa escolha, mas ele ainda não é um "introduzido" na mundo maravilhoso da leitura e tenho medo que a narrativa real e crua da realidade acabe por afastá-lo de vez da literatura, por isso queria pedir-te para me recomendar um romance leve e (com o perdão da palavra) mais adocicado para que ele comece a tomar gosto pela coisa.
Parabéns pelo excelente conteudo e muito obrigado