Do silêncio faço um grito
Que o corpo todo me dói
Deixai-me chorar um pouco
De sombra a sombra
Há um céu tão recolhido
De sombra a sombra
Já lhe perdi o sentido
Ao céu
Aqui me falta a luz
Aqui me falta uma estrela
Chora-se mais quando se vive atrás dela
E eu
A quem o sol esqueceu
Sou a que o mundo perdeu
Só choro agora
Que quem morre já não chora
Solidão
Que nem mesmo essa é inteira
Há sempre uma companheira
Uma profunda amargura
Ai, solidão
Quem fôra escorpião
Ai, solidão
E se morder à cabeça, adeus
Já fui para além da vida
Do que já fui tenho sede
Sou sombra triste
Encostada à parede,
Adeus
Vida que tanto duras
Vem morte que tanto tardas
Ai como dói
A solidão quase loucura
Amália Rodrigues
Versos
2004, ed. Cotovia
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