quarta-feira, 7 de janeiro de 2015

salmo I (no dia 25 de abril)


a solidão é a única coisa que continuamos a partilhar
a solidão...
tudo mais é procura inútil
nós não procuramos nada
nós somos o panfleto vivo
contra a descoberta

reivindico perante o deus uma culpa que é só minha...

não _ berrou Luciano, o jogral.
depois disto vociferou uma série de monossílabos irrecuperáveis
mas quem acredita na tua bochecha linda
que está no transístor, na capa, na cassete
e na enseada verde onde o sol lambe as águas

Luciano, meu arroto cor-de-rosa,
podes parar os teus guinchos de esquilo.
podes parar.
reivindico perante o deus uma culpa que é só minha
a culpa que não cegou os meus múltiplos olhos azuis
apesar dos eclipses

onde está a tua consciência cósmica?
não ouves pulsar o coração da terra?
e o arfar da erva?
e o vento que mais uma vez te esculpe?

o teu espaço é limitado pela barriga de uma mãe ciosa
que não ousa parir-te

                                    (II)
bonjour, Monsieur Chloroforme
elle a dit d'un air agacé

Regina Guimarães
Ritos de eterna posse
1974, ed. autor
imagem: Emil Nolde

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