segunda-feira, 1 de setembro de 2008

algumas palavras de Alice Corinde ilustradas com um desenho feito pela minha pessoa



Ouvirei daqui, dum existir incerto,
as gravações dos ossos no computador,
e a miséria dum silêncio barulhento e imbecil
que escorre pela rádio- enquanto,
mais à frente, o sangue explode no interior das casas
de comércio, ou vai entrando nas páginas a incendiar
da contabilidade. Entenda-se: contas são contas,
mas por isso mesmo é que o tempo se avizinha
dum indolor abismo, dum zero bruxuleante
banalizado. (...)
(...)
No ar rarefeito, a respiração do século aí há-de ficar:
tossindo em frente. Chegará a indústria farmacêutica
desse bom-senso suicida
para manter incólume uma tal sociedade
-este monte de merda reluzente?



Alice Corinde
excerto de "A Música Arde, ao Descer"

de "ARBEIT MACHT FREI"

Fenda Edições, 1985- esgotado
também publicado na antologia "Sião", Frenesi, 1987 (esgotado)

1 comentário:

Graça Martins disse...

O poema e o desenho têm algo de ameaçador. Mas é mesmo assim. A ameaça do "Brilho da Lama" que se reflecte na parte final do poema. Esta sociedade em que vivemos, sobrevivemos e morremos.
Gostei muito da ligação do desenho e do poema.