quarta-feira, 1 de junho de 2011

A Purificação sacrificial

89.
Do condenado que me está mais próximo, não sei sequer o nome. Sei que matou num mês de Março e que, no dia em que matou, passou a existir. Foi então que lhe deram

um nome,

catre

e chicote, e lhe dirigiram a palavra para o interrogar

se só havia mar.

Nem tinha intuição suficiente para medir a ironia da pergunta, e


90.

o seu espírito entrou no jardim do meu pensamento, porque a porta imaginária estava aberta, e a comida irreal das imagens de Psalmodia cheirava bem.

Vieram, depois, um a um, quando me viram a fazer um momente de ramos mortos e de madeiras velhas. Desmanchava as naus para que houvesse lume e calor, e convidei-os a que renovassem intensamente pelo fogo os destinos quue traziam.


91.

Para arder, trazem poucas ideias.

E as intenções, e as atitudes, são as habituais:

mão pesada, boca suja, faca e caralho mortais.

Mas acabaram por me dizer, porque eu lhes disse ou lhes inspirei o que deviam dizer, que tinham lançado matreiramente e, por vezes, a grande distância, e corda da forca no Oceano,

que, nas suas vidas, não fora nem cova, nem senda.

Sabiam, todavia,


92.

que a linha de vida de um podia salvar a linha de vida de outro e que a frota, onde não eram mais nem humilhados, nem distinguidos, era o conjunto ermo das naus e sinal da paranóia real "puer natus est nobis, cujus imperium...".

_Onde está o vosso capitão? -perguntou-lhes Psalmodia, e viu-lhes nas cervizes o medo.



Maria Gabriela Llansol

Da Sebe ao Ser

1988, ed. Rolim

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