Reconheço um vestido meu
em trapo de limpar o pó.
Reconheço uma alcunha
talvez a minha
que designa agora um céu de chumbo
fardado de soldadinho azul.
Está mudada, a casa mãe,
mas não sei bem em quê.
Posso visitá-la
ora cave dum museu,
ora celeiro
crivado de luz e de metralha.
Reconheço as ferramentas em repouso,
um cheiro a sereia no esgoto
e a rastilho de rato em seara.
Reconheço a ocultação do corpo
e o cadáver em exibição.
Mas já não sei quem me deu
o que é ou já foi meu
- vestido, alcunha, museu, celeiro -
e o que jamais foi ter sido
- sereia, seara,
cheiro, rastilho,
o pai morrendo em seu filho.
Conheço a tristeza das ferramentas
e a certeza de terem sido usadas.
poema escrito em Janeiro de 2008, e publicado em Junho de 2009 na revista Brilho no Escuro, nº 1
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