Realmente, nestes dias, já não se justifica fazer um filme de terror. Não se justifica porque já não se sabe. É muito raro o realizador que não faz um filme deplorável, mesmo que parta de uma boa ideia.
Joby Harold, aliás, faz exactamente isso com o seu primeiro filme, "Awake". A ideia inicial é boa. Parte de um facto científico real, de que 1 em cada 700 pessoas que recebem anestesia geral por ano, não adormece, fica consciente, acordada, mas incapaz de mover o corpo.
E se isto poderia criar uma película tensa e perturbadora, na realidade, acaba por criar uma película anedótica e vulgar.
Clay Beresford Jr é um empresário bem-sucedido que mantém uma relação secreta com Sam, a secretária da mãe, Lilith. Além deste quotidiano dark secret, Clay sofre também de um problema de coração que lhe poderá encurtar seriamente a vida, a não ser que receba um transplante. A operação será feita por Jack Harper, o melhor amigo de Beresford.
Depois do escândalo da descoberta da relação com a rapariga de um estatuto social inferior, Clay decide apressar o casamento: casa nessa mesma noite, a noite em que recebe uma chamada que lhe diz que o seu novo coração está pronto a ser transplantado.No início da operação, Clay recebe anestesia, e vai adormecendo lentamente só que... não adormece. Apercebe-se de que não só ouve tudo aquilo que os médicos estão a dizer, como também sente tudo o que lhe estão a fazer. Num transplante de coração.
Já esta cena é estragada completamente pelo uso do cliché: quer seja na música escolhida para acompanhar os pensamentos desesperados de um Clay acordado e imóvel, quer pela incapacidade de Hayden Christensen de exprimir o desespero e a dor de um momento assim. O seu escape seria pensar na recente esposa: e então somos bombardeados por uma série de imagens muito previsíveis para explorar o corpo de Jessica Alba em ângulos semi-picantes e despropositados.
Como se não fosse suficiente, Harold arranja-nos uma conspiração contra Clay, por parte dos médicos, da esposa, basicamente de toda a gente. Ou seja, um abuso do acaso: logo o paciente contra quem se conspirava é que foi ter consciência anestésica. Os diálogos desta cena primam pelo completo irrealismo, contando com uma Jessica Alba ridicula a dizer coisas como
"_Ninguém sabe que mudei de nome e me meti no teu grupo."
como quem despacha o mistério, para não perder muito tempo. Por estas e por outras é que o argumento é tão mau.
Em termos de realização o único plano mais interessante é o plano em que se ouvem os gritos de Hayden Christensen enquanto vemos a sua cara (Supostamente.) adormecida e plácida. Ou então os últimos momentos que Clay passa dentro da sua própria memória, em que as luzes se vão apagando: pode ser previsível, mas não deixa de resultar bem.
Hayden Christensen e Jessica Alba têm aqui interpretações péssimas, sem o mínimo de credibilidade, mesmo aplicados a personagens tão desinteressantes. Terrence Howard é inacreditavelmente mau, com um discurso melodramático e nada a calhar, ainda por cima em monólogo numa leitura a fazer lembrar uma avozinha que conta aos netos a história da Branca de Neve. Em contrapartida, Lena Olin presenteia-nos com uma excelente interpretação, numa personagem interessante (Que é mesmo a única.) que consegue vestir com óbvia facilidade. Palmas para ela. Só para ela.
Veredicto: 8/10
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